terça-feira, 27 de maio de 2014

XV Semana de História- UENP- Jacarezinho- 2013


MEMÓRIAS PROCOPENSES, UM CABEDAL INFINITO DE INFORMAÇÕES: DEPOIMENTO DA SRA. ANA MARIA CARDIN

Profa. Ma. Inês Cardin Bressan[1]
Flávia Taciane do Nascimento[2]
Joana Pereira Repinaldo[3]


Resumo: O projeto Evocações do Passado: Memórias de Procopenses, desenvolvido pelo Grupo de Pesquisa EDITEC – da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, traz à lume histórias de pessoas que nunca tiveram a pretensão de serem escritoras, mas que, através de seus relatos, estão resgatando a memória da cidade de Cornélio Procópio, com enfoque em aspectos da cultura da região. Desse modo, apresentamos nesse artigo a entrevista com a dona de casa Ana Maria Cardin, que, com seus oitenta e um anos, ainda guarda nitidamente acontecimentos de sua vida, expostos neste texto, e que fazem parte de eventos vividos também por outros munícipes.

Palavras-chave: História Oral. Memórias. Relatos. Ana Maria Cardin.

INTRODUÇÃO


Este artigo é um estudo sobre as memórias procopenses, com foco especial em uma de suas moradoras, a Sra. Ana Maria Cardin. Ele é resultado de um trabalho realizado pelas pesquisadoras supracitadas, a fim de resgatar a memória da cidade de Cornélio Procópio – Pr, que faz parte do conjunto de trabalhos realizados pelo Grupo de Pesquisa EDITEC, da Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Criado em 2008, o grupo EDITEC tem como foco estudos sobre as relações entre educação, sociedade, arte e tecnologia, com as linhas de pesquisa: Diálogos Culturais; Educação profissional e trabalho. Ao longo desse período foram realizados alguns trabalhos e projetos e entre eles está o “Evocações do Passado: memórias de procopenses”, que busca justamente resgatar a memória das pessoas que viveram e ainda vivem nessa cidade.
Justifica o seu desenvolvimento, o fato de haver certa necessidade de se conhecer o espaço em que se vive, e é através da história que se resgata a memória e a vida de uma sociedade. Seu objetivo é trazer à luz alguns dos modelos de vida de épocas passadas, cujos moradores ainda estão vivos e mostrar que a narração de um fato, seja ele histórico ou não, é capaz de resgatar a memória de um povo, perpetuá-la e também emocionar os agentes envolvidos nela. Por isso, esse artigo se dispôs a relatar a história da Sra. Ana Maria Cardin e, através dele foi possível conhecer melhor como se enredava a vida das pessoas há quarenta anos, bem como tomar ciência de como elas se organizavam dentro da cidade de Cornélio Procópio, sob o viés de uma moradora, que havia recentemente chegado aqui e construía uma família. Desse modo, a partir da literatura oral que se edifica e atrai novos pesquisadores, foi exposta aqui a experiência de uma senhora de oitenta anos.
Segundo Coutinho (2003), a literatura oral, além de existir em todas as bibliografias, é o elemento vivo e harmonioso que envolve a criança e acompanha, sem cessar, o homem, num eco de memória e saudade. O autor considera todos os seres humanos como portadores de material rico e complexo, recolhido durante toda a vida, desde a infância até a maturidade, arquivado na mente de cada um. A história contada e recontada durante muitas gerações sofre modificações, por isso a importância de projetos que retomam a memória e buscam a história de personagens, muitas vezes, desconhecidas.

D. ANA MARIA CARDIN: ACONTECIMENTOS SOB OS QUAIS A VIDA ACONTECE


Ao enriquecer uma pesquisa com depoimentos de pessoas idosas, consequentemente atribuímos valor à sua memória e, essa atribuição funciona como mola propulsora para o resgate da vida. Normalmente, os velhos não são muito bem integrados à vida moderna e é na família, construída por ele, que acaba encontrando um espaço para ficar e acomodar a sua vida. Não é difícil encontrar aqueles que moram com os filhos, outros que insistem em sustentar suas atividades morando sozinhos, ou aqueles que foram relegados a asilos ou casas de repouso. A juventude, ansiosa pela vida, desfavorece os idosos e poucos consideram suas opiniões, suas falas e suas memórias.
A velhice, decurso fatal daqueles que não morrerem jovens, é tão desvalorizada que chega a assustar os mais destemidos. Muitas vezes, abandonados nos asilos pela própria família, o idoso já não possui papel ativo. Ele se resigna na sua condição passiva.
Segundo Bosi (1994, p. 83), “o velho é alguém que se retrai de seu lugar social e este encolhimento é uma perda e um empobrecimento para todos. Então, a velhice desgostada, ao retrair suas mãos cheias de dons, torna-se uma ferida no grupo”. No entanto, há aqueles idosos que, integrados na vida familiar, convivem harmoniosamente com a sua geração. E são por vezes, sob a visão dos jovens, estranhos e curiosos porque passam muito tempo com o olhar absorto, aquele olhar sem ver, que insiste em buscar amparo em abstrações e ausências.
A faculdade de escutar esvaiu-se no mundo moderno. Todos querem falar, todavia o escutar é para poucos. Por isso, entre o ouvinte e o narrador nasce uma relação de intimidade, pois as lembranças narradas mostram não apenas fatos, mas memórias silenciadas pelo tempo que passou e pelo desinteresse da juventude. Uma das formas de preservar as memórias e a história da literatura é o gênero narrativo, pois através dele se perpetuam as histórias que a vida ofereceu e oferece.
A narração, forma artesanal de comunicação, tece o acontecido até atingir a forma desejada. A história precisa ser narrada e desse modo passada de geração a geração e gerar tantas outras prolongando o original tecidas por outras mãos, por outros dedos, por outros lábios. “A arte de narrar é uma relação alma, olho e mão: assim transforma o narrador sua matéria, a vida humana” (BOSI, 1994, p.90).
Foi em uma tarde amena de abril que a Sra. Ana Maria nos recebeu em sua casa. A entrevista prolongou-se por toda a tarde, mas o tom acolhedor da residência, associado aos crochês das toalhinhas dispostas, nos remeteram a um tempo de infância que já não volta mais. A boa integração com filhos e netos manteve nela a alegria de viver e um sorriso contagiante. Sentamo-nos no escritório e ela, um pouco ansiosa, aguardava as perguntas, não antes de nos oferecer uma xícara (ou chávena?) de chá. Após o chá e explanado mais ou menos qual seria o viés da entrevista, ela iniciou a narrativa.
“Vim para Cornélio Procópio em 1952, sou natural de Guaiçara – SP e em 1954 me casei com Pedro Cardin. A cidade não possuía asfalto e as ruas eram de uma terra tão vermelha que nos surpreendia. Provenientes do Estado de São Paulo, onde a terra era branca e o clima mais quente, assustávamo-nos com a ventania, com o frio e também com a poeira (risos). Juntamente com meu marido, vieram os ternos de linho branco que, após algumas voltas pela cidade, teimavam em parecer mais com marrom claro que propriamente brancos. A cidade deveria se chamar Ventania e não Cornélio Procópio (risos). As minhas roupas eram simples vestidos estampados de xadrez, floral e também eu não frequentava salão de beleza. Só para cortar os cabelos mesmo. Sempre cantei em casa fazendo o meu serviço. As músicas eram sacras voltadas para Jesus e Nossa Senhora. Certa vez, uma vizinha me disse que havia mudado perto dela uma família de passarinhos (risos).
Eu e o Pedro tivemos seis filhos e ele passou a maior parte do tempo de sua vida trabalhando na Santa Casa. Seu trabalho nos fez mais cuidadosos com os filhos, pois devido à nossa baixa escolaridade, tínhamos poucos conhecimentos sobre cuidados com a saúde, o que foi aprendido na função dele. Se faltavam conhecimentos em determinados campos, abundavam em outros: a religião e o carinho!
Meu marido era enérgico, bom esposo e bom pai. Religioso ao extremo e eu o amava por isso, não só por isso, mas pelo seu aspecto pedagógico que tinha em me ensinar. Aprendi muito com ele. Como vim de uma família um tanto quanto rude na criação dos filhos, tentei fazer diferente com os meus. E deu certo! (risos).
Nunca fui festeira. Nem eu nem o Pedro. Nosso divertimento era ir à Igreja, procissões, quermesses e visitávamos nossos vizinhos e compadres. Não havia ostentação, nem poderíamos, mas havia calor humano de sobra. Rezávamos o terço todos os dias (ainda rezo) e o fazíamos ajoelhados. Era bonito de se ver as crianças por vezes ajoelhadas fazendo as suas orações.
Íamos à igreja todos os domingos e eu ia quase todas as quartas assistir à novena da Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, na catedral, ou melhor, ainda era matriz. As procissões também eram belíssimas. Tinha a procissão de Corpus Christi, na qual enfeitávamos as ruas para passar o Santíssimo. Muitas vezes minhas filhas se vestiam de anjinhos para acompanhar a procissão, ou também para fazer a coroação de Nossa Senhora no mês de maio, com as Irmãs da Santa Casa. Eram momentos de muita riqueza espiritual e também familiar. Em Corpus Christi, as ruas eram enfeitadas e a procissão dava volta no Cristo e retornava para a Catedral, voltávamos bem cansados, mas com a sensação plena que só a presença de Deus pode nos dar. O Pedro sempre ajudava nas missas, uma espécie de coroinha adulto, e nós ficávamos observando ele lá no altar junto com o padre. Como eu sempre gostei de cantar, eu cantava o dia todo fazendo o meu serviço. As músicas eram da Igreja, “Confio em Nosso Senhor”, músicas voltadas para Nossa Senhora e com o tempo meus filhos aprenderam também. Com a chegada de um toca discos em casa fomos adquirindo LPs de Padres que iniciavam suas vidas como cantores, como o Padre Zezinho, com o LP Ágape. Nossa afinidade com os sacerdotes sempre foi boa, acho que porque o Pedro teve um irmão Padre e ele foi muito importante para nós todos. Tanto que foi o Padre José Canziora que ajeitou o trabalho na Santa Casa para o meu marido.
O Pedro trabalhava de enfermeiro na Santa Casa e depois de muitos anos passou a fabricar soro. Ele era muito bom no que fazia. Puncionava veias como ninguém e era comum ele chegar a nossa casa dizendo que os pacientes internados pediam que fosse ele a lhes dar as infeções. Ele dizia para mim que tratava os doentes como se fossem pessoas da família dele. O Pedro morreu há 16 anos.
Como eu queria aprender coisas novas porque eu não estudei, pois morava no sítio, eu consegui retirar livros da biblioteca do SESC da cidade. Aos poucos meus filhos foram adquirindo o hábito da leitura. E como era bom! Fazia o serviço de casa, almoço, louça depois íamos, do mais velho ao mais novo fazermos leitura. Todos nós líamos e conversávamos sobre as histórias lidas. Sem família, O Pequeno Lord, Meu pé de laranja lima, Uma casa na campina, Korak, o filho de Tarzan, enfim estávamos sempre às voltas com a leitura. Éramos e somos felizes. Embora a cidade fosse pequena um acontecimento nos deixou muito tristes, que foi o assassinato da menina Cleuzinha. Não gosto muito de rememorar esses fatos porque abalaram a cidade toda. Na Santa Casa, meu marido ficou trabalhando até muito tarde porque eram muitas as pessoas feridas: parecia uma praça de guerra”.
A Sra. Ana deu ainda muitos detalhes sobre o assassinato dessa menina, que puderam ser confirmados nas notícias de Jornais, no entanto, não nesse texto, esse aspecto não será focado, visto que outros do mesmo Grupo de Pesquisa já o fazem. O que vale marcar é que na noite do domingo que a Sra. Ana atendeu os entrevistadores, ela foi hospitalizada com a pressão alta, devido às emoções da lembrança. Hoje, ela passa muito bem e está feliz com a apresentação do trabalho. Mostrou-se interessada em ler o texto e fez as suas próprias correções.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


Esse artigo se propôs inicialmente a apresentar um relato oral de uma senhora em busca das memórias da cidade de Cornélio Procópio. Em nenhum momento houve a pretensão de transformar o seu relato em um texto acadêmico, visto que foram respeitados os seus limites e também foi considerado que, o fato de ela não estar diante do próprio texto, não houve a possibilidade de retocá-lo, de apurá-lo e de ajustá-lo, enfim, ao gosto dos mais puristas.
“A memória é um cabedal infinito do qual só registramos um fragmento” (BOSI: 1994, p. 39), e no relato da Sra. Ana, os acontecimentos surgiam como em “flashes”, porém o viés é o de uma senhora, dona de casa que pouco contato teve com as letras. No entanto, o seu hábito de leitura e a sua vontade em fazer diferente o seu derredor, transformou-a em uma pessoa que desliza entre os ambientes dos mais variados sem constrangimento algum. A partir de seu relato, foi possível verificar e constatar alguns aspectos da vida de antigamente. Um tempo em que os vizinhos se visitavam, os compadres eram responsáveis pelos filhos, caso faltasse um cônjuge. Um tempo que não volta mais, porém permanece vivo na memória dos idosos e daqueles que, ainda que pouco, vivenciaram épocas de outrora.
As tardes frias e a ventania da cidade, os eventos religiosos, o cuidado com os filhos e os acontecimentos sociais que marcaram a vida da Sra. Ana juntam-se às outras pesquisas e constroem um mosaico de citações, como requer Kristeva (1974), no qual vislumbra-se um mesmo acontecimento, por vezes visto por outro viés. É disso que a vida é feita. É assim que se constrói a história.
Enfim, ao término desse artigo, lança-se mão de uma citação de Bosi (1994), na qual, sensivelmente descreveu sobre a última etapa da vida: a velhice:

Integrados em nossa geração, vivendo experiências que enriquecem a idade madura, dia virá em que as pessoas que pensam como nós irão se ausentando, até que poucas, bem poucas, ficarão para testemunhar nosso estilo de vida e de pensamento. Os jovens nos olharão com estranheza, curiosidade; nossos valores mais caros lhes parecerão dissonantes e eles encontrarão em nós aquele olhar desgarrado com que, às vezes, os velhos olham sem ver, buscando amparo em coisas distantes e ausentes (BOSI, 1994: 75).


BIBLIOGRAFIA


BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade – Lembranças de Velhos. 3. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1994.

COUTINHO, Afrânio. A Literatura no Brasil. Vol. 1 – 6. ed. São Paulo: Global, 2003.

KRISTEVA, Julia. Introdução à semanálise. Trad. Lúcia Helena França. São Paulo: Perspectiva S.A., 1974.

MOREIRA, Maria Eunice. (org) História da literatura: teorias, temas e autores. Porto alegre: Mercado Aberto, 2003.

MISCELÂNEA (Faculdade de Ciências e Letras de Assis) Teoria Literária - Periódicos, Assis, SP, v. 2 1995.



[1] Inês Cardin Bressan é docente da FACCRREI/FACED, Mestre pela Universidade Estadual Paulista e Doutoranda pela mesma Instituição. Participa do Grupo de Pesquisa EDITEC
[2] Flávia Taciane do Nascimento – estudante de Engenharia da UTFPR-CP/GP EDITEC
[3] Joana Pereira Repinaldo - estudante de Engenharia da  UTFPR-CP/GP EDITEC

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Artigo apresentado no SICITE 2012- Seminário de Iniciação Científica e Tecnológica da UTFPR - Curitiba, 7 e 8 de novembro de 2012


UM PASSADO QUE SE TORNA PRESENTE – Projeto Evocações do Passado Memórias de Procopenses
Joel Leon Slipack [GP: Editec/Voluntário] 1, Profa. Dra. Marilu Martens Oliveira [orientador] 2, Lucas Siqueira Ribeiro [colaborador] 3

1COELT/UTFPR, Cornélio Procópio, Brasil

2COELC/UTFPR, Cornélio Procópio, Brasil

3COELT/UTFPR, Cornélio Procópio, Brasil

 Câmpus Cornélio Procópio
Universidade Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR
Avenida Alberto Carazzai, 1640

joelslipck@hotmail.com, marilu@utfpr.edu.br, lucas_ribeiro7@hotmail.com

Resumo: Ante as transformações sociais e culturais, a história do povo de determinada região que não é registrada de forma documental perde-se conforme as gerações vão se renovando. Com isso surge a necessidade de se registrá-la, antes que ela se modifique e sua veracidade seja comprometida. Segundo Meihy [1], por ser uma história chamada de “tempo presente” é também conhecida como uma “história viva”. O intuito do projeto é promover entrevistas individuais e/ou coletivas com cidadãos que participaram, de modo direto ou indireto, dos eventos pesquisados e recolhendo documentos e imagens de caráter histórico de arquivos pessoais, para dar origem à história coletiva. Desse modo, o registro documental produzido a partir das coletas de dados do Projeto tem a pretensão de ser divulgado principalmente na forma de livro, com um ou mais volumes. Para tanto, terá como embasamento teórico textos de José Carlos Sebe B. Meihy [1], Paul Thompson [2] e Maria Cecília de Souza Minayo [3], que nos levarão a primar pelo rigor científico, pela objetividade e pela clareza, colaborando para a preservação e a construção da história de Cornélio Procópio-PR, dando-se ênfase aos aspectos culturais, esportivos e políticos, assim como aos fatos pitorescos.
Palavras-chave:Historia Oral; Memória; Moradores Antigos; Cornélio Procópio.
Before the social and cultural transformations, the people’s story of a given region, which is not registered in documentary form, is lost as the generations go renewing itself. With this comes the need to register it before it is modified and its accuracy is compromised. According Meihy [1], because the story to be called "preset time" is also known as a "living history". The aim of the project is to promote individual interviews and/or conferences with citizens who participated, either directly or indirectly, of the events surveyed and collecting documents and images of historical character of personal files, to give rise to collective history. Thus the documentary record, produced from data collections of the Project, pretend to be mainly in book form, with one or more volumes. This will require either theoretical basis texts of José Carlos Sebe B. Meihy [1], Paul Thompson [2] and Maria Cecilia de Souza Minayo [3], who will lead us to excel at scientific rigor, objectivity and by the clarity, contributing to the preservation and construction of the Cornélio Procópio’s history, giving emphasis to the cultural, sports and politicians aspects, and also in singular events.
Keywords: Oral History; Memory; Old Residents; CornélioProcópio.

INTRODUÇÃO Documentando via História Oral 


A história oral é uma metodologia de pesquisa moderna, usada para construção de documentos via registros orais [1]. Consiste em realizar entrevistas gravadas com indivíduos ou grupos que viveram ou testemunharam acontecimentos, conjunturas, modos de vida ou outros aspectos da história contemporânea. Essas entrevistas fazem parte de um conjunto de documentos de tipo biográfico (memórias, documentos escritos, imagens, autobiografias e outros tipos de registro) que permitem compreender como indivíduos viveram e/ou interpretam acontecimentos e situações,envolvendo um grupo ou a sociedade em geral. Isso torna o estudo da história mais concreto, facilitando a apreensão do passado pelas gerações futuras e a compreensão das experiências vividas por outros.
A história oral é uma história construída em torno de pessoas. Ela lança a vida para dentro da própria história e isso alarga seu campo de ação. Admite heróis vindos não só dentre os líderes, mas dentre a maioria desconhecida do povo. Estimula professores e alunos a se tornarem companheiros de trabalho. Traz a história para dentro da comunidade e extrai a história de dentro da comunidade. Ajuda os menos privilegiados, e especialmente os idosos, a conquistar dignidade e autoconfiança. Propicia o contato – e, pois, a compreensão  – entre  classes sociais e entre gerações.  E para cada um dos historiadores e outros que partilhem das mesmas intenções, ela pode dar um sentimento de pertencer a determinado lugar e a determinada época. Em suma, contribui para formar seres humanos mais completos. Paralelamente, a história oral propõe um desafio aos mitos consagrados da história, ao juízo autoritário inerente a sua tradição. E oferece os meios para uma transformação radical no sentido social da história (THOMPSON, 1992, p. 44).
A operação prática da história oral é iniciada com um projeto, o qual indicará o sentido que o trabalho deve tomar, prevendo com detalhes, todas as etapas que serão desenvolvidas no decorrer da pesquisa.

A existência de um projeto elaborado é essencial para o bom desenvolvimento da história oral. Todo projeto de história oral deve se iniciar pela determinação dos objetivos e exige uma pesquisa prévia. Antes de se iniciar a organização do projeto, deve-se ler, instruir e preparar o campo de trabalho (MEIHY, 2005, p. 173).
Portanto, somente após prévias informações sobre o tema é que será elaborado o projeto, atentando-se às peculiaridades inerentes a uma investigação que lida com a oralidade. Segundo Meihy (2005), o projeto é sempre composto por duas partes complementares: os fundamentos temáticos e teóricos, além da parte operacional. Na primeira, é preciso estabelecer a temática e o título do trabalho, apontando-se para uma direção, mostrando-se o ramo da história de que se irá tratar. Destacar o tema é fundamental. Pode-se admitir uma ou mais justificativas, ficando clara a relevância do projeto e as explicações que amparam o assunto. Isso é necessário para evitar trabalhos que tratem as entrevistas apenas como meras entrevistas, que, após a gravação, terão sua finalidade esgotada. Precisam ser definidas hipóteses de trabalho e também o grupo a ser entrevistado, estabelecendo-se parâmetros para identificação, dos indivíduos que serão entrevistados. “Devem ser feitos cortes racionalizados, tais como: abordar só as mulheres ou só os homens; apenas os mais velhos; os que, nos casos de migração, saíram primeiro e receberam depois os outros” [1]. Foi assim que optamos pelos moradores antigos de Cornélio Procópio, que vivenciaram o crescimento da cidade e, concomitantemente, participaram ou souberam de fatos nela ocorridos.
Ressaltamos que há vários tipos de entrevista, classificadas de acordo com uma forma de organização ─ sondagem de opinião, semiestruturada, aberta ou em profundidade, focalizada, projetiva [3] ─ sendo nossa opção a semiestruturada.

METODOLOGIA 


A parte operacional tem início com a realização das entrevistas, que devem ser agendadas. É necessário, então, esclarecer ao entrevistado os aspectos da pesquisa e aquilo que será tratado. No ato da entrevista, antes do início da sessão, é preciso deixar claro que a gravação será conferida e nada será publicado sem sua autorização. É de fundamental importância que todos os equipamentos sejam testados previamente e, sempre que possível, o ambiente onde a entrevista for realizada deve ser tranquilo e agradável. Este é o “trabalho de campo”, que se segue à fase exploratória da pesquisa. Para Minayo, “o trabalho de campo deve ser realizado a partir de referenciais teóricos e também de aspectos operacionais” [3]. Alerta ainda que, por se tratar de pesquisa social, não se trata de campo neutro, transparente, os pesquisadores interferindo no conhecimento da realidade.
Após a execução da entrevista, passa-se do estágio da gravação oral para o do código escrito. Há pessoas que defendem a transcrição absoluta, registrando-se erros de linguagem e até mesmo ruídos (telefone, relógio, latidos, miados, chiados, murmúrios, risos). Outras defendem que as ideias, conceitos e emoções contidos são mais importantes que a palavra em si. “O que deve vir a público é um texto trabalhado no qual a interferência do autor seja clara, dirigida para a melhoria do texto” [1].
Assim que a transcrição terminar, o texto estará pronto para ser conferido pelo colaborador, que autorizará ou não o seu uso, para publicação integral ou parcialmente. Após sua utilização, o material coletado deverá ser arquivado, com a identificação das fitas, ou CDs, fazendo-se cópias para serem guardadas em diferentes locais, como medida de precaução. Acompanhando o material, estarão listas e fichamentos indicativos de data, local, tema e situação da entrevista.

Sempre que possível o oralista deve facilitar a formação de arquivos centrais. Existem associações dispostas a receber doações que, em obediência às regras comuns da área, podem se beneficiar do trabalho de pesquisa preocupados com o progresso da história oral (MEIHY, 2005, p. 186).

Cornélio Procópio e a História Oral

O projeto Evocações do Passado: memórias de procopenses surgiu em 2009, com o Grupo de Pesquisa EDITEC (Educação em Diálogo: Sociedade, Arte e Tecnologia), da Universidade Tecnológica Federal do Paraná Câmpus Cornélio Procópio (UTFPR-CP), e que conta hoje com 16 pesquisadores, 5 estudantes e 2 técnicos. Este projeto apareceu com o intuito de resgatar episódios e pessoas que fizeram parte da história da cidade, tendo passado por algumas etapas: a primeira foi a leitura teórica, além da informativa, em registros escritos, como as obras do professor Átila Silveira Brasil [4] e do senhor Paulo Ribeiro Dias [5], e conversas com pessoas, para a localização dos temas. Foram, portanto, realizadas pesquisas em imagens e relatos de moradores, com o objetivo de se traçar um caminho principal e não o abandonar.
Após isso, foi feito o estudo da metodologia utilizada pela História Oral, para poder se colocar em prática toda a ideia do projeto e fazer com que seus objetivos fossem cumpridos. Atualmente, a investigação encontra-se na fase das entrevistas, que estão sendo realizadas com os antigos moradores da cidade que participaram de uma forma direta ou indireta dos eventos pesquisados. Os entrevistados escolhidos moram em vários locais do município, com profissões diversificadas, favorecendo-se, assim, uma visão plural dos acontecimentos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO 


Os primeiros resultados práticos foram obtidos com a entrevista de Jair Ferreira dos Santos, bancário e escritor, nascido em Cornélio Procópio, em 30 de outubro de 1946. Radicado no Rio de Janeiro há mais de trinta anos, formado em Comunicação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e com uma forte influência humanística em sua formação, presenciou e narrou diversos acontecimentos relevantes para a construção de registros.
O entrevistado deu enfoque a pessoas que compunham a atmosfera cultural procopense nos anos de 1950 e 1960. Entre os nomes que lembrou, na Rádio ZYR5 de Cornélio Procópio, foram citados Ciro Tucunduva, Marcos Alberto e Mercedes Pavani, esta atriz e cantora em radionovelas. Ressaltou que no radioteatro os atores eram amadores, não recebiam salário, e que nos feriados religiosos as rádios transmitiam música clássica (cultura letrada), o que também acontecia nos saraus realizados nas casas das pessoas, que mesclavam o clássico e o popular. A emissora de rádio era um meio de difusão cultural, que alcançava também a elite intelectual, devido à leitura de poemas, comentários de livros e novelas com falas literárias.
Na ZYR5 apresentaram-se grupos como o Regional do Cristalino, do qual faziam parte, além dos músicos liderados pelo violonista Cristalino Ferreira (pai do entrevistado), o cantor Moura e sua mulher, e eram usados instrumentos como piano, cítara, violão e bateria. Seu repertório musical era composto por samba, marcha, fox, baião e xote. O informante destacou também a importância dos locutores de futebol e dos inúmeros programas de auditório, do qual o mais renomado era o do radialista Adelzon Alves, que depois se transferiu para o Rio de Janeiro, trabalhando na Rádio Globo, naRádio Nacional e na Rádio MEC.
Jair Ferreira enfatizou ainda a importância do professor Argemiro (que tinha uma academia de música, cujo destaque era o acordeom), dos grupos de rock e das orquestras, como a Tangará, da qual participavam os senhores Sebastião Cunha, Ubirajara Medeiros e José Marques Godinho (o crooner). Lembrou ainda do sucesso de um típico representante da cultura de massa, o Tião da Mulinha, também do músico americano Booker Pittman, que morou na zona do meretrício procopense; da professora Marúcia Albino, cantora lírica; do Salvador, que tocava trompete; e do Zelão (José Ângelo) Sottile, advogado, dublê de músico. Ainda foram citados locais de disseminação cultural e de entretenimento, como a Aliança Francesa (com as professoras Marta Dequêch e Lelita Martens de Oliveira) ─ que representava a cultura letrada, em oposição à cultura de massa, “americanizada”; o Colégio das Irmãs (Coleginho), que possuía um Conservatório Musical e depois a Faculdade de Música São Domingos; o Salão Dom Bosco (Paroquial), onde ocorriam apresentações de piano, de ballet e de peças alegóricas, além de festivas quermesses e bailinhos; os cinemas (Cines Avenida e São Luiz), com grande público, os quais funcionavam como ponto de encontro. Os parques de diversão e os circos, esperados ansiosamente, eram montados no pátio da estação ferroviária, com músicas, brinquedos, trapézio, globo da morte e animais, atraíam toda a cidade, assim como as famosas quermesses, nas escolas e diferentes salões, com bandas, jogos de víspora, correio elegante, comes e bebes, e sorteios.

CONCLUSÕES 


A história oral como metodologia de pesquisa moderna, usada para resgatar memórias e construir documentos via registros orais, mostra-se eficiente ao analisarmos os resultados já obtidos com o projeto Evocações do Passado: memórias de procopenses. Analisando a história por diversos pontos de vista, procurando construir um registro amplo e confiável. Além do escritor Jair Ferreira dos Santos foram colhidos depoimentos do jornalista e radialista Luiz Antônio Morgante, da senhora Ana Maria Basso Cardin e da professora Marilu Martens Oliveira. O projeto está em andamento e outras entrevistas serão realizadas. Fotos e panfletos de arquivos pessoais, de caráter histórico, estão sendo reunidos para dar origem à história coletiva. Não queremos apenas relembrar fatos e nomes, mas o sentido do que é ser um procopense, atingindo o objetivo de todos conhecerem um pouco mais sobre esta cidade que acolhe a todos de braços abertos, com o seu Cristo Rei.

REFERÊNCIAS 


[1] MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral. 5. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2005.
[2] THOMPSON, Paul. A voz do passado: história oral. Tradução Lólio Lourenço de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
[3] MINAYO, Maria Cecília de Souza. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 25.ed. Petrópolis,RJ: Vozes: 2007.
[4] BRASIL, Átila Silveira. Cornélio Procópio: das origens e da emancipação do município. Cornélio Procópio, Pr: [s.n.t.], 1988.
[5] DIAS, Paulo Ribeiro. Cornélio Procópio – a história em prosa e verso. Londrina, Pr: Gráfica e Editora Modelo, 2000.

Estação Ferroviária. Bem-Vindo a Cornélio Procópio!

A estação ferroviária em Cornélio Procópio foi inaugurada no dia 1 de dezembro de 1930.



Pertencia à linha Ourinhos - Cianorte e estava localizada no km 425.

A caixa d'água foi construída na mesma época da inauguração da estação.

Em 2001, a estação passou por uma reforma e se tornou o Museu de História Natural.


Os Grandes Desfiles Procopenses

7 de setembro - Colégio Nossa Senhora do Rosário.

 7 de setembro - Em frente a Eletrodisco.

  7 de setembro - Colégio Cristo Rei.
Ao lado, Posto Platizek; e ao fundo, o cinema.

  7 de setembro - Praça Brasil / Antigo Cine São Luiz e Quitanda Sumi.

  7 de setembro - Av. XV de Novembro.

 Desfile Cívico - Vitamina Real.

Desfile da Semana da Comunidade (22/09/74) - Tiro de Guerra, turma de 1974.
Loja A Brasileira.

  7 de setembro - Tiro de Guerra.
Av XV de Novembro.

 7 de setembro  - Desfile com balizas.

  7 de setembro - Av. XV de Novembro - Praça Brasil.

 7 de setembro - Centro Cultural

  7 de setembro - Tiro de Guerra.




Evolução da Atual Catedral Cristo Rei de Cornélio Procópio

1935 - Ainda como Igreja Cristo Rei

 Aproximadamente em meados da década de 1960.
Já havia se tornado a Igreja Matriz de Cornélio Procópio.

Já no final no início da década de 1970.
Foto colorida e muitos Fuscas.

1945 ainda como Igreja Matriz e atualmente Catedral Cristo Rei.

segunda-feira, 24 de março de 2014

O que é o EDITEC - Educação em diálogo: Sociedade, Arte e Tecnologia?


Criado em 2008, o grupo EDITEC tem como foco estudos sobre as relações entre educação, sociedade, arte e tecnologia, com as linhas de pesquisa: Diálogos Culturais; Educação profissional e trabalho. Atividades desenvolvidas pelos membros do grupo: Projetos: de extensão (SETI- Universidade Sem Fronteiras)- Ler com prazer para melhor viver, e Saberes e diálogos entre a Universidade, a Cultura popular e a comunidade assentada: resistência e consciência crítica, ambos em Congonhinhas-PR;cultural:Biblioteca, um palco iluminado e Exposição interativa. Ações afirmativas na UTFPR-CP (enfoques: cotas e gênero).Pesquisas e atividades em andamento:Evocações do passado: memórias de procopenses;projeto Abraçando a escola: múltiplos olhares, um objetivo;Cinema de todo mundo (em andamento). Pesquisas concluídas: "A necessidade da reestruturação do ensino de engenharia frente às exigências da sociedade contemporânea" e "Práticas de leitura: do gibi ao hipertexto". Membros do grupo participaram e/ou estiveram à frente de eventos: Exposição fotográfica: Hijos de la Pachamama (UTFPR-CP); I ELIJNP (I Encontro de Literatura Infantil e Juvenil do Norte do Paraná), UENP; apresentação do livro Caleidoscópio, da Academia de Artes, Letras e Ciências de C. Procópio (ALACCOP); III SELET- Seminário de Letras, UENP; II COPELI- II Colóquio de Pesquisa em Literatura; II CONALI- II Congresso Nacional de Linguagens em Interação, UEM; I Seminário sobre Educação Profissional Integrada à Educação de Jovens e Adultos, UTFPR; I Seminário PROEJA- UTFPR: Políticas, inclusão e profissionalização; XXVI Seminário de Extensão Universitária da Região Sul- SEURS; XXVII Seminário de Extensão Universitária da Região Sul- SEURS; II Semana Pedagógica da FACCREI/FACED - O Ensino Superior no Contexto Atual.Metodologia e Didática de Ensino; II Colóquio de Pesquisa em Literatura,Memória e Pertencimento. Despertar(Obra de artes visuais/Cinema - 2008- Filme premiado). Curso de História do Paraná (UTFPR-CP)